siiky
2025/09/16
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2025/09/16
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Mário de Sá-Carneiro
Amavam-se loucamente, com um tão grande amor, que só poderia ser vencido pela morte...
Em breve iriam percenter um ao outro.
Ela, orfã de pai, vivia com sua mãe, uma senhora de 50 annos, que, pelos desgostos, apparentava têr mais de 60.
Mãe e filha eram extremamente parecidas. Elle dizia até, muita vez sorrindo:
Quando olho para tua mãe, vejo-me transportado d'aqui a muitos annos, quando fôrmos velhos, quando fôres uma avósinha.
Se a desgraça não dura sempre, a felicidade muito menos. N'um domingo, a pobre senhora morreu. Era precisamente no dia seguinte que os dois jovens se deviam casar.
Em vez de beijos, lagrimas...
Elle quiz despedir-se da morta; acercou-se do seu leito, curvou-se e pousou os labios na gelida face...
No mesmo instante, porém, recuou, os cabêlos em pé, os olhos desmesuradamente abertos...
É que o rosto que elle via, contraîdo num esgare horripilante, era a caricatura horrivel d'aquelle que desejaria cobrir de beijos!
O seu amor não poude resistir a essa terrivel visão~ Sim, desde esse momento, como unir á sua essa bocca que tanto apetecera, se, ao beijal-a julgaria encontrar em vez de uns labios frementes e tepidos, outros, gelados e hirtos? Como estreitar esse corpo que ambicionara confundir com o seu, se a imagem aterradora de um cadaver hediondo se ergueria deante dos seus olhos allucinados?
Como, sim, como? De forma alguma!...
Por isso partiu para uma pequena viagem... Nunca mais voltou...
Quem ousará dizer que, mais uma vez, o amor não foi vencido pela morte?...